domingo, 10 de abril de 2011

Textos da Mostra - Curadoria

(Estes textos foram expostos separadamente, nas lombadas das paredes cenográficas que davam acesso à exposição)



1.

O projeto parte primeiramente da reivindicação de espaço para divulgação dos processos de pesquisa dos artistas envolvidos, considerando-se este movimento como sendo indispensável à prática e amadurecimento da produção artística contemporânea, ao partir-se do pressuposto de que o trabalho toma diferentes significados e rumos quando colocado à mostra, à prova do público.

Em um segundo momento parte-se para a discussão em relação à estrutura da qual todos nós advimos: um pouco de pesquisa revelaria, em origem, ao que se propõe o curso de graduação em artes; no entanto, não está nos pressupostos iniciais a chave para entrever os desdobramentos que o curso pôde e pode tomar; as constantes reformulações - de licenciatura para bacharelado, de artes plásticas para artes visuais - indicam que a orientação, em relação à gama de profissionais a serem formados na área, depende de premissas constantemente renovadas.

Diante disso, pensar a formação de profissionais na área também se alinha com a crescente insurgência de uma demanda de formação em arte e cultura, como proposição voltada à consolidação de coletividades que possam se apropriar de um repertório comum, em suas diversas facetas, e dele se valer para construir novas proposições.

Por fim ]ENTRE[ também é um convite para a participação coletiva, no intuito de criação de uma rede em que possamos vincular e veicular outras iniciativas, estratégias e percursos que estabeleçam diálogos voltados à expansão e à troca.

Sejam bem-vindos.



2.2 2.

A mobilização de repertórios diversos propiciada pelo contato com uma obra só encontra consonância de sentido caso seja possível que ela se articule à outras obras ou manifestações artísticas. Os fios soltos se amarram à partir de elementos que emergem da lógica interna dos trabalhos, mas que são combinados a elementos externos, extrapolando os limites do suporte ou da estrutura, no sentido em que criam relações de pertencimento à outros contextos; os trabalhos sugerem, induzem, propõem.

Em um contexto amplo, obras de diferentes artistas poderiam se associar num discurso curatorial que girasse em torno de um tema comum; no entanto, a lógica ou linguagem própria de cada artista apenas se esboçaria: no movimento em que se apresentasse única, logo se diluiria no fluxo da corroboração para com um discurso mais abrangente.

Em nosso caso específico, o intuito é apresentar estes artistas. Neste sentido, não seria justo apresentar apenas uma obra, ou uma série. Seria encapsular os possíveis desdobramentos de seus processos de pesquisa em uma só roupagem, o traje de gala à mercê do tempo e de outras oportunidades de exposição que possibilitassem mostrar versatilidade, nuances, ou uma singular capacidade de inovação ainda não entrevista.

O lance está no intervalo entre os trabalhos, na ponte, no não dito que os conecta; não no dado, mas no vago. Nas nuances que sutilmente completam um ao outro.

A idéia aqui então é trazer à vista por quais campos se transita; como cada um incorpora e seleciona elementos de uma profusão de referências, em busca da criação de sua própria linguagem ou lógica pessoal. E no vislumbre deste trânsito, e de suas entrelinhas, espera-se que possamos apreender os caminhos que podem se desvelar nas suas trajetórias pessoais.



3. 3.

A lógica a ser definida conforme as demandas para apresentação dos trabalhos destes artistas também poderia ser transposta para o processo ao qual se submete a apresentação do trabalho de curadoria.

O congelamento provisório de um processo em andamento se torna um fim e um ponto de partida; afirmação que se constrói no mundo, que colocada em contraposição a outras afirmações, torna-se objeto de referência, de formação de repertório, no qual idéias se complementam e se combinam como cartas na manga com as quais jogamos para ilustrar pensamentos, noções e imagens de mundos possíveis.

O apreço pela experimentação ou edição de recursos e caminhos previamente já traçados - a questão do gesto, o uso de materiais do cotidiano, a problematização do suporte, o uso da estrutura museológica - traz indícios de uma percepção estética resultante de um olhar que forçosamente deve escolher entre todo o repertório de possibilidades visuais que se nos é apresentado.

E essa escolha, refletida na produção, evidencia também aquilo que não quis ser mostrado: o que paralelamente nos dirige aos interesses de cada um, a partir do momento em que conseguimos vê-los como indivíduos inseridos e resultantes de seu próprio tempo justamente nas entrelinhas daquilo que permitem ser entrevisto.

A maneira como as imagens são combinadas estrategicamente nos trabalhos artísticos ativa, reconfigura e transforma os repertórios; e é desse intervalo que se extrai a experiência que aqui queremos mostrar.



4.3 4.

Considerando que o trabalho artístico se apresente como um encerramento provisório de um processo de pesquisa, no qual questões específicas são colocadas como determinantes da forma e resolução geral, e em que se escamoteiam desdobramentos e nuances possíveis de uma forma passada ou de uma forma a vir, nada nos impediria de deslocar essa lógica para a do próprio sujeito em processo, que manifesta o que se resolve de si para o outro no instante em que compreende necessária alguma forma de apresentação de si como um todo íntegro, genuinamente justificado.

Algo que poderia se aproximar da idéia de uma espécie de still de um filme, no qual o movimento se cristaliza em imagem de fascínio, milimetricamente construída, e ainda assim, defeituosa no que deixa escapar.

Por um lado, assumir uma transposição de sentidos do objeto de arte para o sujeito, seria dizer que o sujeito também se constrói através de um processo artístico, encerrando, em performance de improviso, as questões mais pertinentes no dado momento em que expõe a si como resultado de sua própria criação, objeto colado à própria pele;

Por outro, seria dizer que a forma com a qual lidamos com as imagens mediáticas, sonoras e verbais - em borbotões - e a tentativa de torná-las unidades discursivamente deglutíveis, passa a operar também como estratégia para apreender o outro: um outro seccionado em imagens ou takes, desprovido de continuidade que não seja também uma justaposição de imagens, criadas na intenção de resolver provisoriamente aquilo do qual não se pode descolar, nem ter distanciamento suficiente.

Nenhum comentário:

Postar um comentário